A Grande Viajem Já por Angola adentro... Corria o ano de 1959 e o mês de Novembro do mesmo ano e uma grande viajem começa com uma estirada de comboio de umas centenas de quilómetros, com alguma comodidade pois até restaurante havia, mas com um calor cada vez mais aumentando de intensidade e luminosidade, até uma pequena Vila chamada Dondo. Uma localidade que embora sem asfalto se via já com desenvolvimento industrial e comercial e cujas ruas de um paralelismo geométrico e largura pouco vulgares parecia já virar-se para o futuro. O Caminho-de-ferro de Luanda rumava a Zenza do Itombe onde tomávamos outra composição que nos levava ao Dondo enquanto aquela seguia para Malange, e que em mercadorias e passageiros tinha um movimento que deixava antever um futuro promissor para aquelas regiões. No Dondo as árvores que ladeavam as ruas eram já gigantes o que para além da sombra que ali era um bem, lhe dava um aspecto de Vila verde e bem cuidada. Nas ruas não se via lixo algum. Ali se pernoitava e se comia em condições para o tempo, bastante razoáveis. Porém daí em diante a coisa mudava: a viajem era feita em camioneta mista de 5 passageiros na cabina e o resto era ocupado por carga e quem queria sujeitar-se, poderia viajar em cima da carga, como a mim me aconteceu. Poderá estranhar-se mas é que o transporte só se realizava ou duas ou três vezes por semana. Havia então que aproveitar pois não se ia para férias. Eram então os homens que se sujeitavam dando mesmo com direito de aquisição, o lugar interior a alguma senhora. O lugar na carga era o que melhor se adaptasse ao jeito e “comodidade” do corpo para se poder bater uma soneca e sem roubar o lugar aos carregadores nativos. E isso era possível, não vão pensar que não. Era-se novo. Á hora de almoço estava-se a passar Calulo, uma Povoação que não teria meia dúzia de casas, encravada em pleno mato, creio que floresta mesmo, que subsistia pelo comércio e alguma pequena Indústria como a de fabrico de sabão. O Comércio era movimentado por troca de artigos das chitacas alguns para serem transformados como o milho e então a troca seria por farinha já moída e peixe seco principais produtos de subsistência nativa, em geral. O sabão existia e era vendido além das bebidas: cerveja e vinho por vezes já meio adulterado talvez, mas que surtia efeitos desejados pelo bebedor e vendedor. O nativo tendo dinheiro para bebida e comida não trabalhava enquanto tudo isso se conjugasse bem. O comércio de Madeiras era ali, creio que muito marcante. Um almoço rápido, carga e descarga de bagagens e a caminho novamente até que ao anoitecer deparávamos com a Quibala, terra também perdida na imensidão interior que subsistia pelos mesmos meios da anterior só que em maior escala pois era atravessada por uma grande via asfaltada e movimentada que ligava Nova Lisboa a Luanda e ao Norte e sul de Angola. E logo se dava conta da existência de um quartel de tropas mistas e creio que também havia um posto de Policia de Segurança Pública. Mal deu claro, para dar uma passeata quer pela hora adiantada, quer pelo cansaço, menos evidente pela juventude, alegria e desejo que então me possuía de chegar á Vila da GABELA, hoje cidade que seria o nosso último transbordo daquele transporte tão sui generis, para um carro já digno desse nome que nos levaria ao final do roteiro, á chamada BOA ENTRADA. Mais uma vez partimos de madrugada e passadas algumas horas, eu penso que quatro ou cinco lá avistávamos e chegávamos á Vila de Gabela, que nos pareceu logo de chegada uma terra agradável e pelo movimento que mostrava via-se alguma vida nas suas ruas embora de terra batida mas bem macadamizada, de dimensões bem largas para o tempo e de alinhamento ordenado. Parámos e não sei mais o que lá fizemos que passado algum tempo lá fomos em jeep descapotável Willis durante sete quilómetros cafezais adentro, com pasmo e admiração por uma beleza de paisagem que não pensava existir no mundo: árvores frondosa que protegiam e alimentavam de sombra e água os cafeeiros. Estes, para quem não conhece são pequenas arvores ou arbustos de altura igual ou pouco superior á de um homem, de porte rectilíneo e folha enervada e muito verde, que com suas bagas carnudas pegadas ao caule e aos ramos, umas vermelhas de sangue, as maduras, outras de cor verde que dão ao conjunto uma imagem singular de beleza, contraste e perfeição como só a natureza pode dar. Foi para onde fui viver e trabalhar. Lá permaneci não muito tempo, cerca de três anos, já não recordo exactamente mas o essencial e indispensável para conhecer e me adaptar ás exigências do novo trabalho que por vezes misturava as raias da Enfermagem com as da Medicina. Com muito estudo, força de vontade e preserverança cedo tomei as rédeas do trabalho, pois a Longanhia esperava-me. Passado esse tempo em camioneta de carga, com a minha mulher grávida da primeira gestação, eis-nos a caminho por estrada sinuosa sem nem cor de asfalto onde os buracos e rilheiras eram mais que a parte plana. Perto de duzentos quilómetros, quase dois dias de viagem com almoço cozinhado na estrada com água que ali corria. Mas isso dá para outra estória. A Longanhia era como já disse, a sede de outras pequenas Feitorias com quatro ou cinco casas de construção gémea e definitiva, um Hospital, um escritório, um armazém e uma grande fábrica de laboração contínua dedicada á transformação de démdém, o fruto da palmeira, em óleo de palma o equivalente ao nosso azeite, embora com gosto e textura diferentes. O gosto, esse sim, é divinal… De- Augusto Rebola "Crónicas da CADA" Esta foi a 2ª Edição. NGA SAKIRILA KINENE!! MBOIM !! :) AVISO-Estes escritos estão registados e protegidos pelo IGAC |
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