O Senhor “Administrador” de Fazenda A Fazenda Longa-Nhia era formada por extensas plantações de palmeiras de cujo fruto, as sementes massudas feitas em cacho, se extraía entre outros o Óleo de Palma. Este seria là o que foi e era para nós em Portugal, o azeite de oliveira talvez até com propriedades acrescidas. A textura mais consistente que a do azeite, e o gosto que dava aos cozinhados era superior e excelente. Uma boa “moamba de galinha” ou um bom “ calulú de peixe” sobressai a qualquer prato quer de lá ou de cá e quem não gosta á primeira não necessita teimar muito ou ter pressa para ficar rendido ao gosto tropical destes prazeres da gula. Num certo ano pelos meados da década de 60, um senhor … que geria os trabalhos de uma Feitoria das que formavam a fazenda, a Candumbo, venceu pelos seus anos de trabalho e permanência um direito a que chamávamos de Licença Graciosa. Era isso um tempo de licença para férias que por opção poderia ser gozado na Metrópole-Portugal (o Puto), com viagens e vencimentos pagos pela Empresa em regra feitas por mar, mas nuns luxuosos paquetes de que na altura o nosso país dispunha e em número considerável. O avião estava reservado para as esferas superiores de direcção porque mais caro e com menos tráfego. Geralmente e conforme a categoria sucedia esta graça de 4 em 4 anos, mas havia mais e menos espaçada. Eis então o Pereira* de malas aviadas rumo ao puto, como então se usava dizer, virado para as suas terras de norte, penso eu, onde chegou cheio de vontade e energia para se fazer notar ao que constava quer pela sua conversa fluida dilatando os poderes que em África possuía, quer pela demonstração de uma boa quantidade de dinheiro que do bolso generosamente lhe saía, quer lançando para o ar e para os presentes o seu forjado nome de administrador. Solteiro e ainda vivendo solitário no seu restrito mundo deitou o Olhar a uma senhora Professora primária que se deixou embaciar pelas aparências e vai de se “ apaixonar “,se é que a paixão existiu, por quem na sua Feitoria lhe foi prometendo o melhor: um pequeno reinado. Ele vivia então a 16 quilómetros da Sede apenas com mais um europeu seu colaborador numa casa coberta de colmo e onde os restantes habitantes eram todos nativos e trabalhadores braçais que viviam com seus familiares nas sanzalas vizinhas e no meio do mato. Então e segundo se dizia a Snrª Professora teria tido com engodo a promessa de que, além de dinheiro e uma vida folgada, poderia leccionar pois alunos ali não lhe faltariam para letrar. E vai de se unir, não sei se logo em Portugal se foi ter com ele casada por procuração com então se usava. De paquete até Luanda e tudo estaria conforme com todas as esperanças que levavam todos aqueles que se metiam a caminho daquelas terras. Em Luanda foi-lhe mostrada uma cidade deslumbrante que só custará a acreditar a quem nunca teve o privilégio de a ver, e que a deixou maravilhada. Era de facto uma cidade Princesa implantada numa rainha que era Angola e em África. A Lolinha*, assim se passou a chamar, era uma pessoa de feição graciosa e de tez muito mimosa e clara, ligeiramente ebúrnea, meiga, bem falante, cordata e conversadora de quem passou a ser difícil desprendermo-nos sem um certo sentimento de comiseração, impossibilidade e revolta tudo ao mesmo tempo, enquanto seu marido nos dava o desejo de dele nos separamos pois que o seu discurso oco nos deixava a saber que depois de falar meia hora ainda nada tivera dito que se aproveitasse, literalmente. Tentou a Senhora Professora adaptar-se ao novo e estranho meio fazendo por valer as suas qualidades de docente mas viu que a demora nos resultados era longa demais. Não havia educandos, nem escola. E depois tudo se agravou quando veio a saber que filhos já dificilmente os teria e então vai de começar a ter crises de melancolia, manifestações de desespero, culpabilidade do marido que a teria enganado, dizia, e dela própria que se teria deixado cair no engano e por tudo isso, chegava a ter crises que rimavam com histeria. Então quando estas aconteciam lá ia um emissário chamar socorros de saúde. De início um calmante, parecia o ideal. Mas cedo verifiquei que umas palavras, uma conversa mais íntima resolviam o que os medicamentos teriam dificuldade de fazer. Era daí que o chamar-me com muita frequência me levava já a ter dificuldades em satisfazer aqueles tantos pedidos de assistência, pois que a viagem por vezes era desastrosa e algo penosa. Mas a Senhora fazia-me tantas confidências e lamúrias que me custava deixá-la assim abandonada já que compreensão da situação pelo seu marido não a havia, pois que para ele aquilo era a melhor vida e a sua Lolinha é que era piegas porque “nada lhe falta”, dizia... Numa das solicitações á minha ida parecia-nos impossível a deslocação pelas chuvas, mas tentei escarranchar-me no capôt de um tractor e a muito custo lá cheguei com as partes de assento quase tostadas pelo calor da máquina e dos solavancos Numa certa noite chega-nos um mensageiro com a noticia de que “si lá não ia depressa a sinhôla ia mesmo morer. tava mesmo male. Sô Fermero vem dipressa mesmo” (sic)... Mas como? Tempo de chuvas torrenciais tudo quase intransitável e era meia-noite e o caminho era povoado por toda a bicharada de alto porte desde a onça, á pacaça e ao elefante? Também eu tinha medo além do mais... Mas um rapazinho nosso colega de trabalho embora administrativo, propôs que na moto dele uma 125 apenas, depressa chegaríamos lá Mas isso ainda é loucura maior. Mas de momento, fez-se-me luz e lembrei-me que o que ele queria era estar alguns momentos em casa da amada na outra dependência onde teríamos de passar. E não resisti. Tá bem, vamos. Passámos em casa da menina primeiro e obrigatoriamente, e o papá foi ajudar-nos a passar numa jangada manual o rio Nhia Seriam 2 horas da madrugada. A felicidade que vi no rostito de ambos fez esquecer toda a ensombração da viagem, e se até aí a moto andou bem, para lá, ainda fez melhor não fôsse a certa altura ela se negar a subir uma encosta . Então desço, poiso a mala e vai de empurrar. Volto a pegar a malinha, monto e vai de andar. Aí não ganhei para o susto quando oiço um restolho enorme entre as palmeiras mas ele disse-me que eram bandos de galinhas do mato. Só que passado pouco tempo oiço umas trombetas com um som muito estridente e aí não necessitei de explicação: eram mesmo elefantes só que bastante longe... Resolvido o apoio psicológico voltámos ainda escuro e a atravessar novamente o rio de jangada. Já na outra margem enquanto se prendia o aparelho flutuante, começo a sentir picadas que me iam subindo cada vez mais pernas acima. Queixei-me: oh! é kissonde, disseram logo, o que queria significar que estava a ser mordido por umas formigas grandes, carnívoras, que, quando ferravam se as puxássemos pelo abdómen ele se separava da cabeça. Quando pegavam qualquer animal ou insecto apenas lhe sobrava o esqueleto, se fosse duro. Então lá em casa despi-me todo e á luz ainda dum candeeiro a petróleo, fomos, repito, fomos tirando uma a uma todas as malvadas que tiveram a ousadia mas se calhar o prazer também de me ferrar já em zonas que o decoro me impede de referir aqui... A vida em Angola tinha muito destas coisas. E era bela. Para mim todas foram maravilha..... *nomes fictícios De- Augusto Rebola "Crónicas da CADA" Esta foi a 13 ª Edição. NGA SAKIRILA KINENE!! MBOIM !! :) AVISO-Estes escritos estão registados e protegidos pelo IGAC |
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