OUTRA GRANDE VIAGEM da minha vida Esta sim é que eu considero a primeira viagem digna deste nome. Querem saber porquê? Venham comigo. Partimos da Boa Entrada, a sete quilómetros da Gabela. Peguem na vossa mala de porão, mais uma malita de viajem e um ou dois caixotes de mantimentos e aproximem-se do meio de transporte nada mais nada menos que uma camioneta bedford de 5 ou 6 toneladas e sejam bem-vindos a bordo. Nossa companhia: o motorista na cabine um europeu e carregadores penso que dois ou três. Passageiros: eu e minha mulher grávida de primeira vez de três meses, pé no acelerador e boa viagem. Mas por falta de lugar, só a vossa imaginação poderá seguir connosco. Ao sair da Gabela perde-se quase a linha do que é estrada e segue-se pisando as mesmas rilheiras ou linhas dos rodados que todos os carros pisavam. Com uns abanões laterais que as vezes chocam os nossos ombros, passam imensidões de terrenos tipo meio pelado ou anharas, de vegetação escassa e baixa, intercalada de grandes arvoredos diria mesmo umas pequenas florestas. Alguns animais de pequeno porte espreitam a nossas passagem até ao limite certo do perigo e outros já de maior porte mostram-nos as suas partes traseiras na fuga. Saímos ao despertar do dia, e são já horas de almoço e o caminho ainda não estará muito pelo meio. Estranho é o que encontrámos. Um senhor transmontano ou beirão dá-nos a seu modo as boas vindas, vive ali sozinho mais a sua prole mestiça e manda preparar o almoço cuja ementa já me não lembra mas penso que churrasco do quintal. E eu pensei e tentei perceber o que faria aquele homem viver tão distante do que chamamos civilização, mas o que mais me impressionou é que ele apesar do transporte que tinha não podia viajar com facilidade e muito menos com pressa no tempo pois nem estradas nem o tempo incerto ajudariam muito. A nossa viajem decorria a 20 quilómetros hora se tanto e depois vim a saber que parte do ano as chuvas não deixavam viajar. Então o seu mundo era a família, o comércio que o fazia ali estar e prover com precisão no tempo o seu armazém para que o comércio de vendas e trocas se não interrompesse para bem dele e de quem comprava ou trocava. Se fosse hoje não sei como as Finanças o colectavam e cobravam… Almoço pronto, saboreado, alguma conversa e novamente a caminho estrada fora a contar de ao entardecer chegarmos ao termo da viagem. Já tínhamos notado e experimentado o perigo de algumas pequenas correntes de água que o caminho o tornavam mole e ameaçaram enterrar as rodas do camião. Mas até ali vencemos. Passámos poucos quilómetros e num riacho que atravessava as rilheiras pareceu que não seria fácil passar já que começámos a sentir a rodas patinarem. Saímos, tentámos e voltamos a tentar. Eu disse para o senhor motorista que se passasse ali ao lado parecia terreno liso e bom. Foi o pior. Começou o rodado traseiro, sempre ele, a patinar. Abria-se caminho á frente mas andava alguns centímetros e o eixo já estava quase engolido, embora com o carro já a meia carga pois a outra parte já tinha sido descarregada. Nada se progredia e o sol baixava lentamente e de frente nenhum carro igual vinha que nos ajudasse num reboque. Então vamos ficar aqui e vamos pedir ao senhor se dá dormida pelo menos á Senhora. Mas a verdade é que com o esforço e o nervosismo, o estômago já não sabia onde parava o almoço. Ideia: levamos conosco bacalhau, batatas e fogão a petróleo e aqui temos água corrente, vamos cozer um jantar. Se bem dito melhor feito. Sentados no chão, todos comemos do mesmo alguidar com satisfação e bebemos água do regato corrente. E que bem que soube. Mas não resolveu o seguir viajem. Voltámos a pé alguns quilómetros e assim pedimos para ficar. Prontidão e umas mantas por cima e por baixo a servir de lençóis e em cima de uns ensacados macios passamos a noite. Ninguém se queixou nem da comodidade nem pela mistura de cores de pele nossas e dos carregadores nem pelos odores que certamente de noite foram preenchendo o espaço e substituindo os nossos cheiros temperados a banho. Cedo acompanhei o pessoal para retomar a azáfama enquanto minha mulher ficava. O carro foi literalmente descarregado e mesmo assim só saiu dali quando um outro em sentido contrário e da mesma companhia, a Companhia Angolana de Agricultura dedicada ali ao palmar, nos deu um impulso para depois passar também. Era já tarde. Carrega-se o carro enquanto vou buscar a minha mulher e seguimos para ao cair e muito da tarde vermos a Longanhia que não de Café mas de uma beleza de Palmar que vim a apreciar cada vez mais enquanto que ali permaneci. Será que consegui fazer sentir o que poderá ser uma viagem em Angola mato adentro? Oxalá para se não pensar erradamente que era tudo belo e fácil. Mas com que gosto e saudade penso nesta viagem voltando a repeti-la por igual, se isso fosse possível. Mas o tempo não volta atraz… De- Augusto Rebola "Crónicas da CADA" Esta foi a 5 ª Edição. NGA SAKIRILA KINENE!! MBOIM !! :) AVISO-Estes escritos estão registados e protegidos pelo IGAC |
Clica no Play e sintoniza a nossa RádioAutorCrónicas Da C.A.D.A. ,é um folhetim que conta histórias veridicas de Cadaences e amigos das nossas páginas no FB e aqui do nosso Blog no Site da Comunidade. "Crónicas da C.A.D.A."
|